quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Como e porque se faz sacrifício em Candomblé

Judeus comem apenas alimentos kasher (ou kosher), incluindo as carnes, que devem ser da forma preconizada na halachá (lei judaica).
Muçulmanos comem alimentos halal.
A forma ritualizada de matar estes animais se chama shechita no judaísmo e dhabihah no islamismo.
O Candomblé também tem uma forma ritualizada de matar os animais que nos servirão de alimento.
Esta forma ritualizada serve para sacralizar aquele alimento, tornando-o válido para a alimentação de um iniciado em Candomblé.
Devemos levar em consideração que o Candomblé deriva do culto aos Orixás, Minkissi, Akixi, Voduns etc, praticado na África faz mais de 2.000 anos.
Nosso povo dependia da caça para se manter e quando se tinha uma boa caça isso era considerado uma benção de nossos orixás.
Hoje não precisamos mais caçar, mas, exceto por isso, mantemos o resto da ritualística, como memória cultural e respeito aos nossos orixás.
Escolhemos um animal saudável, agradecemos aos orixás pela benção de termos comida em nossa mesa, pedimos perdão ao animal por tirar sua vida ao mesmo tempo que agradecemos ao animal por dar sua vida para alimentar nossa família ou nossa comunidade (lembre-se que a origem de nosso rito é um rito tribal).
Tiramos a vida do animal da forma mais rápida e indolor possível. Por isso nossos obés (facas) são tão bem afiados.
Retiramos do animal as partes que culturalmente nosso povo não come (em quase todos os povos africanos não se come cabeça de animais ou as patas e se evita ingerir o sangue).
Estas partes que não comemos são as partes que oferecemos aos orixás como agradecimento pela fartura em nossa mesa. O sangue em geral é vertido sobre os assentamentos dos orixás. O sangue dos animais sacrificados é usado de várias formas em nossa ritualística, mas em geral ele não é ingerido.
O couro do animal é seco e usado em nossos tambores (ilus, ngomas etc) e a carne é consumida. Deve ser TODA consumida. Não deve estragar nada para que a morte do animal não tenha sido em vão.
Quando o sacrifício é pequeno, tipo um frango ou dois, em geral é comido pelos próprios integrantes do barracão (nome genérico dado aos nossos templos, mais corretamente chamados de Ilê Axé, Nzo, Kwe etc).
Quando são animais maiores ou em grande quantidade costumamos distribuir carne para todos que batem à nossa porta e pedem, bem como para a comunidade no entorno de nossos barracões. Aprendemos desde cedo que aquela benção, de ter comida em nossa mesa, se não estamos dispostos a compartilhar com nosso próximo, isto mostra que não merecemos e os orixás podem deixar de nos abençoar.
Aí você diz que candomblecista também compra carne no mercado e eu te respondo que sim. Nossa religião é uma religião de sobreviventes. Sobrevivemos à escravidão escondendo nossa fé. Precisamos comer e nem sempre temos como organizar um ritual para matar cada animal que vamos comer.
Mas se você vir alguém fazendo crueldade com qualquer forma de vida que seja, tenha certeza de que isso NÃO É CANDOMBLÉ! O Candomblé é regido pelo respeito à vida e à natureza.

Tiago de Ogunjá